quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A Viagem do Algodão



Enquanto o sol ia caindo lentamente no final da tarde uma brisa tranqüila e suave balançava levemente a plantação de algodão.

Nesse mesmo momento um senhor de idade já avançada colhia os frutos de seu trabalho. O suor escorria pelo rosto queimando os olhos com seu teor salgado no mesmo tempo em que caía no solo, fertilizando-o com amor. Amor esse que se estendia também pela sua família. Um amor puro e fraterno, onde o respeito de um pelo outro estava sempre presente.

A esposa e os quatro filhos haviam aprendido a gostar da profissão daquele humilde senhor. O que antes era uma obrigação com o tempo acabou transformando-se em paixão.

No fim do dia vários fardos de algodão ocupavam o pequeno galpão daquele humilde sítio.

Quando amanheceu um caminhão de uma indústria têxtil chegou para negociar mais um carregamento. Era o próprio dono da empresa que dirigia e negociava. Bastante cuidadoso, ele selecionava o material e, com a ajuda da família do dono do sítio, ia carregando o caminhão.

Após terminar a transação comercial, despedem-se mais uma vez.

-Foi um prazer negociar com o senhor, seu Zé. –disse o empresário.

-Quê isso, seu moço! Eu que agradeço. Deus lhe pague por comprar “cum a gente”.

O caminhão segue, então, para a indústria. Começaria agora uma nova etapa na “vida” daqueles “pedaços de nuvem” brancos como a luz e suaves como a paz. Máquinas incansáveis e mãos muito habilidosas se encarregavam de dar uma forma para aquele macio material. Dava gosto de ver a satisfação nos olhos dos funcionários da fábrica após terminarem a transformação do algodão num belo e resistente tecido, onde muitos deles eram, agora, coloridos.

Ao fim da tecelagem uma empresa de confecção encomendou a primeira remessa de tecido. Já estava chegando o fim do ano, época em que a demanda aumentava devido às datas comemorativas, o que aquecia cada vez mais as vendas dos comerciantes, além das ofertas de emprego.

O tempo passou, o tecido virou roupa e teve seu momento de beleza. Cobria o corpo de uma senhora muito rica, admirada pela sociedade e respeitada por todos, devido sua delicadeza, compaixão, humildade e caridade por todos os que não possuíam um teto para morar.

Os anos passaram e o tecido, que por sinal era um belo vestido, perdeu sua utilidade. Com isso sua dona decidiu doa-lo para a caridade, pois o fim do ano estava chegando e, com ele, as campanhas de arrecadação de agasalhos e mantimentos também.

Por coincidência ou sorte o desbotado vestido caiu nas mãos de uma senhora habilidosa. A moça da campanha de arrecadação iria dar-lhe apenas uma peça de roupa. Mas o olho da senhora tocou seu coração tão fortemente que não pôde negar. Além disso, aquela mulher lembrava tanto sua avó que quase chorou de emoção. Mas conteve suas lágrimas e agiu de forma profissional, afinal era preciso demonstrar confiança para aquela gente tão sofrida.

A velha senhora ganhava a vida confeccionando tapetes com retalhos que ganhava de algumas costureiras e de suas patroas, pois também trabalhava como doméstica.

Não podia descansar porque com os tapetes ela reforçava seu orçamento, do qual tirava parte do seu sustento, além de ajudar os filhos e netos.

Todos os tapetes eram bonitos. Mas havia aquele em que ela tinha colocado toda sua “alma” na hora de confeccionar. Com isso o velho vestido havia encontrado uma nova forma de vida. Foi tingido com uma cor vibrante que acabou chamando a atenção da dona de uma loja de um shopping da cidade. Ela sempre procurava por novidades e justamente aquele belo tapete feito à mão parecia que havia caído do céu.

Decidida ela se aproxima da velha senhora e diz:

-Vou levar esse! Se vender bem encomendo outros com a senhora, está bem?

-Deus lhe pague, moça! –disse a senhora após finalizar a venda em sua barraca na feira-livre.

Algumas horas depois o tapete enfeitava a vitrine da loja. Como era uma peça única chamava bastante atenção.

Minutos mais tarde uma senhora elegante pára diante da vitrine e se depara com a beleza daquela peça. Não resistindo à tentação entra na loja e compra o produto com satisfação e prazer, pois sabia que levava vida nova para embelezar a decoração de sua luxuosa casa. Porém ela nunca poderia imaginar que toda aquela beleza que hoje enfeitava um canto de sua sala já havia, um dia, enfeitado o seu corpo, mas que agora retornava ao seu velho lar completamente renovada e irreconhecível.

FERNANDO MAGALDI
Data original: 07/09/2007
Data do texto final: 29/01/2008

3 comentários:

Anônimo disse...

Enternecedor...aquece o coração irmão. Beijos,Pri

FERNANDO MAGALDI disse...

Muito obrigado!
Esse conto foi planejado e construído para ser uma viagem com diálogos entre os pedaços de algodão. Mas achei melhor tirá-los porque alongaria demais a história. Talvez algum dia eu o reescreva em forma de livro infantil, tipo as histórias do Sítio do Picapau Amarelo e outros autores talentosos (independente da fama) que conheço e admiro.
Obrigado pelo comentário, um abraço no coração e volte sempre!

Anônimo disse...

Eu sempre estarei por aqui! Abração! Priscilla

Direitos Autorais Deste Blog

Licença Creative Commons
Contos Fantásticos - Terror, Amor e Suspense de Fernando Magaldi é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-SemDerivados 3.0 Não Adaptada.
Baseado no trabalho em http://contosfantasticosdavidamoderna.blogspot.com.br/.
Permissões além do escopo dessa licença podem estar disponível em fermagaldi2@gmail.com.